Sarampo pode enfraquecer as defesas do organismo das crianças por até três anos


Vacinação não oferece proteção apenas contra o sarampo, mas também impede outras doenças.

Já se sabia que o vírus do sarampo abala o sistema imunológico das crianças temporariamente, deixando-as expostas ao contágio de outras doenças oportunistas. Até agora, os cientistas acreditavam que essa vulnerabilidade se estendia por um ou dois meses após a infecção. Mas um novo estudo mostra que o sarampo pode enfraquecer as defesas do organismo das crianças por até três anos — deixando-as altamente suscetíveis a outras doenças mortais ao longo desse tempo. A pesquisa, realizada por cientistas da Universidade de Princeton (Estados Unidos), foi publicado nesta sexta-feira (8) na revista Science.

Com base nas conclusões do artigo, os autores afirmam que a vacinação contra o sarampo não oferece proteção apenas contra o vírus dessa doença, mas também impede que diversas outras doenças infecciosas tirem proveito do enfraquecimento do sistema imunológico causado por ela. De acordo com eles, a descoberta ajuda a explicar porque as campanhas de vacinação contra o sarampo têm impedido muito mais mortes do que se previa.

Vacinação impede muito mais mortes do que se previa.

Para o autor principal do artigo, Michael Mina, da Universidade Emory, que participou do estudo como pesquisador pós-doutorando em Princeton, "o sarampo acaba aumentando a predisposição das pessoas às doenças mais prevalentes na população".

— Na maior parte, são infecções respiratórias bacterianas, como a pneumonia, a sepse, a bronquite e a bronquiolite. Mas o sarampo também abre caminho, em menor número, para doenças como diarreia e disenteria.

É espalhada pela tosse, espirros, beijos, pelas gotículas que saem quando se fala e qualquer outra forma de contato com fluidos do nariz de uma pessoa infectada e boca, diretamente ou através de objetos (como copos e talheres). É altamente contagiosa, 90% das pessoas que ainda não possuem imunidade são contaminadas caso compartilhem o mesmo ambiente com uma pessoa infectada por algumas horas por dia.

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Segundo Mina, o estudo apresenta provas epidemiológicas de que o sarampo leva o organismo, por longo tempo, a um estado de "amnésia imunológica". As células de memória do sistema imunológico — capazes de identificar as partículas infecciosas que já tiveram contato com o organismo — são parcialmente exterminadas.

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Uma das autoras do estudo, Jessica Metcalf, professora de Ecologia e Biologia Evolutiva de Princeton, disse que "já sabíamos que o sarampo ataca a memória imunológica — e que a doença enfraquece o sistema imunológico por algum tempo".

- Mas esse artigo sugere que a supressão imunológica dura muito mais do que se suspeitava. Em outras palavras, se você pegar sarampo, ao longo de três anos você poderia morrer de algo que não seria capaz de matá-lo sem a infecção por sarampo.

De acordo com Mina, a descoberta sugere que a vacinação contra o sarampo traz benefícios bem maiores que a proteção contra a própria doença. "É uma das intervenções com melhor custo benefício para a saúde global", disse ele sobre as campanhas de vacinação.

Segundo Mina, o estudo foi motivado por uma pesquisa feita por Rik de Swart, da Universidade Erasmus (Holanda), que encontrou profundas associações entre sarampo e esgotamento de células de memória. O trabalho holandês demonstrava que o vírus do sarampo ataca linfócitos T — células fundamentais para a "memória imunológica" —, gerando um estado de "amnésia imunológica". Depois de cerca de um mês, essas células de memória voltavam a agir, mas, em vez de proteger contra as infecções memorizadas anteriormente, ficavam direcionadas exclusivamente contra o sarampo.

A partir dessa informação, Mina e sua equipe levantaram uma hipótese: se a amnésia imunológica de fato ocorre por causa do sarampo, isso deveria ficar evidente ao examinar dados populacionais — e examinando esse tipo de dado, seria possível dizer em quanto tempo o sistema imunológico se recupera depois do sarampo.

Assim, os cientistas examinaram dados populacionais detalhados dos Estados Unidos, Inglaterra, País de Gales e Dinamarca — os únicos países onde havia estudos com todas as variáveis necessárias para a análise. Eles estudaram a mortalidade entre crianças de um a nove anos, na Europa, e de um a 14 anos, nos Estados Unidos, em épocas anteriores e posteriores às vacinações.

As análises revelaram uma correlação muito forte entre a incidência de sarampo e as mortes por outras doenças em um período de cerca de 28 meses depois da infecção. A conclusão se aplicava a todos os grupos etários nos três países, antes e depois dos períodos de vacinação.

- Agora também queremos analisar o impacto de longo prazo da 'amnésia imunológica' na morbidade e na doença. E precisamos explorar as consequências das nossas conclusões para os países com poucos recursos, onde o sarampo causa uma mortalidade muito mais imediata.

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